

‘Aos Pedaços’ é um filme de drama e suspense dirigido pelo grande diretor Ruy Guerra (‘Os Fuzis’, de 1964). Com uma estética em preto e branco e uma estrutura que lembra o teatro, o longa acompanha Eurico Cruz (Emílio de Mello), um homem que leva uma vida dupla com duas mulheres chamadas Ana (Simone Spoladore) e Anna (Christiana Ubach). Enquanto ele transita entre essas realidades espelhadas, recebe um bilhete anônimo (assinado apenas por “A”) ameaçando sua vida, desencadeando uma jornada de paranoia e dúvida.
Parece interessante, não? Parece, mas esse interesse vai se esvaindo durante os 92 minutos. Com certeza, se o filme tivesse sido trabalhado enquanto peça de teatro, o sucesso estaria garantido, mas não é o caso.
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É um espetáculo audiovisual, quando o assunto é fotografia e ambientação
O grande trunfo do filme está em sua atmosfera visual e sonora. A fotografia impecável de Pablo Baião aposta em alto contraste e sombras marcantes, reforçando a sensação de que o protagonista está preso em um labirinto psicológico. O desenho de som de Bernardo Uzeda contribui para essa imersão, tornando o suspense ainda mais palpável.
Por outro lado, a narrativa pode ser um desafio para alguns espectadores (digo isso, pois foi um ponto crucial para mim). A estrutura teatral, com diálogos intensos e um ritmo propositalmente repetitivo, reforça o estado mental fragmentado do protagonista, mas também pode tornar a experiência bem cansativa. O filme exige paciência e disposição para embarcar em seu universo “simbólico”.
Outra coisa que me deixou desconfortável é que (nos últimos minutos) o filme ainda conta com uma certa “explicação” desnecessária.


O elenco também ajuda a sustentar toda a tensão da produção
A entrega absoluta do elenco também é um ponto positivo. Emílio de Mello constrói um Eurico Cruz enigmático e inquietante, oscilando entre momentos de aparente controle e surtos de desespero conforme a trama avança. Seu olhar e sua postura corporal carregam muito da tensão do filme, o que é essencial em uma história onde a incerteza domina.
Simone Spoladore e Christiana Ubach, vivendo duas versões de uma “mesma mulher”, trazem nuances distintas para suas personagens, tornando essa duplicidade ainda mais intrigante. Enquanto Spoladore exala um mistério contido, Ubach imprime uma energia mais volátil, criando um jogo de contrastes que enriquece a narrativa. As interações entre elas e Emílio de Mello são marcadas por diálogos afiados e um jogo de olhares que diz mais do que muitas palavras.
Guerra é um diretor que geralmente se arrisca e nesse não foi diferente
Aos 93 anos, Ruy Guerra demonstra ousadia ao construir um thriller psicológico que brinca com a realidade e a ilusão. ‘Aos Pedaços’ pode não agradar a todos, mas é um excelente exercício de estilo e experimentação que prova que o veterano cineasta ainda tem muito a dizer.
Durante essa resenha você deve ter sentido que gostei de muitas coisas do filme e ainda assim achei cansativo. Pois é, mesmo com tantos pontos positivos, talvez essa atmosfera narrativa proposital de teatro me fez entediada ao longo da produção. Sinto que se estivesse vendo no teatro, teria me deleitado mais.
Dê uma chance! O longa tem sua estreia marcada para alguns cinemas brasileiros a partir do dia de hoje (13 de fevereiro).
Assista ao trailer de ‘Aos Pedaços’:
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