Assistir “O Tempo e a Sala”, peça de estreia nacional no Festival de Curitiba, foi uma experiência que pode ter me incomodado um pouco. Esta deixou um certo desconforto no ar talvez pela linguagem, pelo texto, elenco, atuações, atos etc. É difícil pontuar vários fatores que não tiveram uma boa recepção pelo público em geral, mas vou tentar ser ao máximo justo e claro no que trago nesta crítica. 

O Tempo e a Sala é um espetáculo com texto de Botho Strauss, autor europeu de grande renome no teatro alemão. O elenco da peça celebra os primeiros anos do Festival de Curitiba diretamente dos anos 90, formando um reencontro de atores da época no elenco da peça.

Certamente, pensaria em intitular a peça como complexa. Mas será que o que falta mesmo é entender e interpretar melhor a peça? É a capacidade cognitiva em jogo ou um texto pesado demais para absorver e entrar no ritmo? Foram esses os questionamentos que a peça me levantou.

Foto: Humberto Araujo/@humbertooaraujo

Primeiramente, temos um elenco majoritariamente branco. Junta-se isso a uma peça com texto europeu e um figurino e interpretação de época, e temos um espetáculo que entrega o formato ‘clássico’ do teatro. O ponto de incômodo surge em algo que traz o sentimento do pacto da branquitude no teatro, com um certo saudosismo ao teatro de época, deixando de lado a diversidade e a pluralidade que o teatro precisa trazer em pleno século 21. 

Entre monólogos e diálogos, percebe-se uma certa semelhança do texto da peça com a melancolia e o existencialismo de Fernando Pessoa, um dos maiores poetas da língua portuguesa. Percebo isso talvez não como algo positivo, já que a interpretação dos textos deixam a desejar em muitos momentos. 

Falta certa profundidade em várias cenas, mais de alguns atores quanto de outros. A interpretação profunda se faz extremamente necessária para expressar textos profundos e complexos, ao contrário da superficialidade e da falta de conexão com os diálogos. 

Além da interpretação, temos uma adaptação do texto para a peça que deixa a desejar na hora de passar a mensagem para o público. Não que seja necessário o entendimento total da obra, mas acredito que é essencial termos aberturas para interpretações mais claras, possibilitando uma conexão mais precisa com a obra. 

Foto: Humberto Araujo/@humbertooaraujo

E talvez seja este o principal gargalo de O Tempo e Sala. A falta de conexão com o público seja do texto, da atuação, do prólogo, dos monólogos e diálogos. A linguagem é o fator determinante em um espetáculo. E fica o questionamento – é certo o teatro se fazer inacessível para todas as pessoas no que diz respeito à construção de sua obra e a sua interpretação? 

O que eu quero dizer é que o teatro não pertence mais à branquitude e muito menos à burguesia. A plateia que se faz presente é plural, consciente, diversa e é cada vez mais ocupada por corpos estigmatizados e até mesmo periféricos – mesmo que minimamente, já que a ocupação ainda está só no começo. É para todo e qualquer tipo de público que um espetáculo precisa se comunicar. É atravessar o peito ou se fazer de acalanto, reflexão, incômodo, celebração, encanto e informação. O Tempo e Sala não cabe mais neste tempo, não cabe mais em 2023 e é pequena demais para mentes sedentas por pensar e se entender. 

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Escrito por

Alison Henrique

Publicitário, Empresário, Dançarino, Cantor, Estudante de Filosofia e, claro, APAIXONADO por Cinema, Arte, Música e Livros. Crítico de Cinema aqui no {Des}Construindo o Verbo com muito sentimento, emoção e boas reflexões pra gente mergulhar nas obras do cinema contemporâneo. Seja Ficção, Drama, Romance, DC, Marvel, Ficção Científica, Bom, Ruim, Médio ou Péssimo. A gente sempre vai se encontrar por aqui pra discutir um pouco sobre tudo. Instagram: @alisonxhenrique.