Você está diante do cinema absurdo de Yorgos Lanthimos e sua capacidade de transcender as narrativas e oferecer experiências inimagináveis para a tela do cinema. Após dirigir a obra prima que foi Pobres Criaturas (disponível no Disney+), que simplesmente concorreu em 11 categorias no Oscar, logo atrás de Oppenheimer (disponível no Prime), e venceu 4 delas, sendo Melhor direção de arte, Melhor maquiagem e cabelo, Melhor figurino e o prêmio de Melhor atriz para Emma Stone; Yorgos aposta suas fichas em “Kinds of Kindness”, ou em sua tradução, “Tipos de Gentileza”, uma espera mais que bem-vinda para 2024 mas que talvez não vá de encontro com as expectativas que temos. Além de trazer novamente Emma Stone para brilhar nas telonas, nós temos uma proposta diferente, diria que perturbadora e bastante estranha, que pode gerar inúmeras opiniões diferentes e trazer à tona a capacidade de Lanthimos de fazer-nos pensar, discutir e confrontar ideias diferentes e complexas sobre a mesma obra. Vem comigo que te conto um pouco mais, claro, sem spoilers.
Sinopse
Três histórias antológicas que giram em torno de um homem que tenta assumir o controle de sua própria vida, um policial cuja esposa parece uma pessoa diferente e uma mulher que procura alguém com uma habilidade especial.
Um filme autêntico com o jeito Lanthimos de ser
Imagine um filme com três histórias diferentes que trazem à tona a habilidade do ser humano de tornar sua existência a coisa mais estranha do mundo. “Kinds of Kindness” é mais uma criação esquisita, absurda, complexa e incompreendida de um cineasta que tem sua assinatura mais que concreta no mundo do cinema. Desta criação, presenciamos um roteiro fenomenal que não quer a normalidade como apoio, mas os caminhos mais improváveis da humanidade e a improbabilidade da mente de formular situações abomináveis demais para serem verdade (não posso duvidar da realidade do mundo que vivemos, confesso), mas que trazem o mundo real como pano de fundo para o que, muitas vezes, fechamos os olhos (mas abrimos a mente).
Tão subjetivo que chega a ser non-sense e até um pouco cansativo
Talvez este seja o ponto mais importante deste longa: a habilidade de ser inconsequente na subjetividade, não temendo a perda de sua essência ou até mesmo a conexão com o público. Às vezes precisamos nos segurar em algo, talvez até mesmo nos fatos que os sentimentos nos propõem e que não enxergamos. Neste caso, nos seguramos nas no tema central da gentileza e sua grandiosidade de interpretações, que nos traz mais um estranhamento e confusão do que uma clareza do que conseguimos compreender. “Kinds of Kindness” é uma montanha russa de loucuras e do abstrato absoluto da mente humana.
Gentilezas que beiram a humilhação e a bizarrice da existência humana
Este é o flerte mais forte da gentileza — com o obscuro da mente humana e até mesmo o doentio. Yorgos Lanthimos consegue destrinchar uma amabilidade do ser humano e torná-la algo difuso e até mesmo bizarro. Isso levanta uma questão importante sobre os limites do humano e a transformação de algo puro, lindo e sincero em algo distante de sua essência. Lanthimos carrega em sua obra uma veia de humilhação, transgressão, com doses de psicose e um confronto com a psique humana tanto na abordagem da narrativa quanto no levantamento de questões que nos fazem conflitar as ideias e pensamentos após assistir o longa.
Sexo grupal, Cultos sexuais, Seitas bizarras e Canibalismo
Só coisa leve e confortável. É neste mar que navega “Kinds of Kindness” que, em primeiro momento, pode parecer leve e inocente em sua proposta, mas se aprofunda em temas um pouco desconfortáveis de ver nas telonas. Apesar dos pesares, Lanthimos não aparenta ser nenhum sádico ou psicopata cinematográfico na proposta do longa (pelo menos por enquanto), muito pelo contrário, ele traz contextos compreensíveis para algumas cenas e, para outras, algo um pouco mais abstrato demais para entender. Neste caso, ficamos com o subjetivo e o surreal que é mais seguro.
Um elenco pesado para uma história ainda mais pesada e complexa
Além de Emma Stone trazer todo o seu brilho e talento inegável para três personagens completamente diferentes e, ainda sim, hipnotizantes, é difícil eleger as melhores atuações do longa com um elenco tão diverso e talentoso. Emma é a ponte entre a loucura e a lucidez e consegue entregar peculiaridades e transformações impactantes em sua atuação na obra.
Como companhia, temos Willem Dafoe em atuações emblemáticas e caracterizações impressionantes, caminhando por caminhos diferentes de sua carreira e no qual nunca o imaginamos. Em seguida, Jesse Plemons é o nosso homem de mil faces e, para mim, o destaque do longa junto à Emma, em collabs emblemáticas nas cenas e nas histórias. Jesse se destaca por sua atuação que parece inofensiva, mas que detém intensidade e objetividade. Para complementar, Margaret Qualley compõe cenas de personagens muito importantes no longa e ganham merecido destaque com sua dramaticidade única e presença inegável. E por fim, temos a participação especial de Hunter Schafer que trouxe um gostinho a mais de loucura e estranheza para o longa.
“Kinds of Kindness” ocupa a prateleira do absurdo, do incompreensível ou do questionável? Ainda não me decidi
Em uma trialidade por atenção, “Kinds of Kindness” parece não saber seu lugar e tenta emplacar doses cavalares de subjetividade em uma obra ambiciosa e inovadora, confesso, mas ainda perdida e sem propósito. Afinal, dá pra se entregar ao abstrato e às mil interpretações da vida? O que esperar dessa experiência como espectador? São perguntas que a gente não consegue responder, pois cada experiência é individual. Este é um longa único, autêntico e inquieto. É para o humano se ver, se reconhecer, não se reconhecer, se questionar e duvidar do que a existência humana é capaz de fazer.
Confira abaixo o trailer oficial de Kinds of Kindness (Tipos de Gentileza), que estreia nesta quinta-feira, 22 de Agosto de 2024, nos cinemas de todo o Brasil.