Navegar pelas camadas profundas a história complexa de um artista (ou pela história de um artista complexo), é uma das maiores paixões não só minhas, mas de fãs fervorosos pelo mundo todo. Unir a vida à uma obra transforma nossa experiência para todo sempre. É o sonoro que se torna audiovisual e se junta aos milhares de sentimentos que afloram nesse momento – e foram muitas coisas que senti ao ver o longa Elvis, que me pegou desprevenido e me deixou em estado de choque. O filme é tudo isso, acreditem.
O longa Elvis (2022), conta da ascensão ao estrelato, a história do ícone do rock Elvis Presley (Austin Butler), que mantém um relacionamento complicado com seu enigmático empresário, Tom Parker (Tom Hanks), por mais de 20 anos.
Elvis é uma escola de cinebiografia
Cada cena, cada detalhe, cada plano da câmera, cada linha escrita do roteiro. Certo de que, no cinema, a essência do artista transpassada para o audiovisual é sempre um ponto a ser seguido, além do fato de Elvis Presley ser um verdadeiro showman; tenho pra mim que este longa dita uma nova era das cinebiografias, com um formato que conversa profundamente com o artista, fatos históricos, pontos de vista e, inclusive, com o presente.
No roteiro, temos o exuberante diretor Baz Luhrmann (O Grande Gatsby – 2013, Moulin Rouge – 2001) que além de dirigir e produzir o longa, assina o roteiro em parceria com Sam Bromell, Craig Pearce e Jeremy Done. O quarteto resulta em um roteiro bastante complexo e com uma riqueza inconfundível. Todos os aspectos que narram a história são encantadores, além do ritmo que entra em um estado frenético e encontra um equilíbrio perfeito para emocionar e também te arrebatar nos momentos de clímax.
Confesso que, por um segundo, minha mente já acostumada (ou viciada) com o ritmo e linhas temporais comuns de outras cinebiografias, questiona a introdução ou desenrolar de fatos. Mas no final, o entendimento é de uma obra com propósito muito bem definido, e que não decepciona no conjunto e estrutura. Além disso, Elvis conversa impecavelmente com elementos históricos que se relacionam com as referências e bagagem musical do artista – além de acontecimentos político-sociais de grande peso.
No visual, Elvis conta uma história estética que é um banquete para os olhos. A produção é impactante nos gráficos, cores, edição visual, figurinos, maquiagens, ambientações e tudo mais. Se tratando de looks, temos figurinos impecáveis que carregam a essência do artista e se entrelaçam com a história, inclusive com roupas assinadas por Prada e Miu Miu especialmente para Elvis e Priscilla. Mas muito além disso, temos o time de maquiagem com um trabalho impecável principalmente com Tom Hanks, que interpreta o Coronel Tom Parker; e para completar temos as ambientações com cores muito vivas (com contraste direto com os figurinos) e um trabalho de iluminação de grande impacto – que conversa com o brilho gigante de Elvis.
Desde já, desejo boa sorte para as futuras produções relacionadas à vida de artistas, pois será um desafio e tanto entregar experiências como Elvis entrega.
Um longa pra entrar em êxtase – Elvis é a pura e verdadeira manifestação da arte
A construção impecável do filme transparece em todos os detalhes possíveis – o que faz a experiência ser, deveras, um frenesi completo. Elvis é um filme definitivamente para transcender. Além de oferecer a experiência musical riquíssima e de grande presença dos sucessos de Elvis Presley, que dispensa comentários e apresentações; temos uma abordagem incrível de como a arte do rock encontrou em Elvis Presley o porta-voz perfeito que arrebatou o coração de uma geração. Desde os minutos iniciais do longa, temos momentos de puro êxtase musical que revelam Elvis como um artista que manifesta em si todo o poder da arte. É claro que temos nas atuações, o grande fator de destaque para tal acontecimento – e é neste momento que entra a presença e a perfeição de Austin Butler como Elvis. Simplesmente algo mágico. Austin, você tem meu coração.
Um Elvis impecável – Austin Butler é o maior de todos
O olhar penetrante. A voz aveludada, sexy, poderosa e carregada de paixão. O rebolado, movimentos pélvicos e frenéticos. O talento e rebeldia impecavelmente representados. Os trejeitos únicos e inconfundíveis de Elvis. Nossa, são detalhes demais para abordar aqui – e Austin Butler consegue entregar todos com excelência. É realmente algo impressionante o trabalho e cuidado e precisão que Austin teve ao entregar uma atuação memorável do cantor e lenda do rock. A figura do Elvis foi muito representada e revivida em todas as cenas, o que é um convite para quem é fã, sentir todas as emoções de vivenciar essa experiência mágica nos cinemas, e para quem não é fã também, que irá conhecer e se apaixonar por um dos nomes mais importantes e de grande impacto da cena musical – ou do rock, sendo mais específico.
E muito além das cenas reais do cantor na frente das câmeras, em suas performances memoráveis, que sim, foram eximiamente reconstruídas; temos o lado pessoal de Elvis Presley vindo à tona, onde Austin mergulha tão profundamente no personagem que, em certo momento, sinto estar diante de cenas da vida real de Elvis. A relação com a família, amigos, esposa e empresário, nos mostra todas as faces de Elvis representado em uma transformação gradual durante todaa carreira, que vemos claramente no trabalho incrível de maquiagem e na interpretação de Austin, que consegue transpassar o mood de cada fase da vida do cantor com uma facilidade surpreendente.
O protagonismo do rock, rhythm & blues – um protagonismo negro
O longa Elvis traz algo de grande peso e importância para a história do rock – o protagonismo negro como base e pioneirismo de um estilo que, até então, era representativamente branco. Sabemos que nos dias de hoje, identificar e tornar públicas as conquistas negras é um movimento mais que essencial para marcarmos o lugar do negro na história – um lugar que foi negado com muita repressão, violência e opressão do racismo, principalmente na época em que se passa o filme, onde Elvis vivia diante da segregação racial e o duro contraste do apartheid.
É simplesmente algo surreal presenciar a abordagem do rhythm & blues no longa. As performances cheias de poder e arrebatadoras além de mostrarem a verdadeira veia artística de Elvis, marcam um lugar impactante no longa, trazendo um protagonismo único para as cenas em que o povo negro preenchia a tela de cinema com voz, tons arrebatadores, dança frenética, habilidades impecáveis para tocar e letras marcadas pela paixão pela música. Ponto alto para performances onde eram representados Little Richard (Alton Mason), “Big Boy” Crudup (Gary Clark Jr) e claro, de Sister Rosetta Tharpe (Yola), ninguém menos que a verdadeira precursora e inventora do rock.
Inclusive, a discussão de que o verdadeiro Rei do Rock na verdade é uma Rainha, se tornaram constantes na internet nas últimas semanas, inclusive hoje (13), Dia Mundial do Rock. E está corretíssimo trazer este grande fato para a história – o rock n’ roll foi criado em 1940 pela cantora e guitarrista estadunidense Sister Rosetta Tharpe, uma mulher negra com uma guitarra nas mãos que incendiou o ritmo e protagonizou solos e riffs viscerais, com uma pegada forte e rasgada no instrumento, e uma voz cheia de profundidade na interpretação, além do ritmo que traz suas raízes até hoje.
Elvis traz ainda a representação de B.B. King, interpretado por Kelvin Harrison Jr. A presença do Rei do Blues na história de certa forma reforça a presença negra no filme, além de retratar a relação próxima que tinha com Elvis, que era de admiração. Mas o que de fato transparece é que o contato próximo de Presley com a comunidade negra transparece uma certa apropriação, mas acredito que dentro dessa discussão cabe a nós, no presente, oficializar o pioneirismo negro na história do rock para as gerações futuras, além de marcar este feito na obra de Elvis Presley.
Tom Hanks é um mago da atuação
Tom Hanks prova que é um ator completo ao interpretar o Coronel Tom Parker. Desde sua maquiagem incrível para interpretar o Coronel, temos sua presença muito forte na narrativa, sendo um grande contador de história para a trama. Com a caracterização impecável, o que se destaca é sua voz que traz um sotaque carregado e creio que bastante proposital, o que acaba por dar um ar bastante “vigarista” para o personagem, além de conferir um toque de mistério sobre o desenrolar dos fatos que são um verdadeiro espetáculo.
Elvis é uma obra visual e musical profunda – um espetáculo completo
Capaz de despertar inúmeros sentimentos ao mesmo tempo, Elvis é um espetáculo e tanto nos cinemas, seja para quem é um fã fervoroso do cantor, quanto para pessoas como eu, que até então não tinha uma certa profundidade sobre a carreira e obra de Presley. Estou além de simplesmente entregue à discografia e biografia de Elvis, em uma relação ainda mais profunda e cheia de paixão pelo rock, rhythm & blues, que ocupam um espaço muito especial na minha vida.
Para quem é apaixonado por música e entra em êxtase pelo rock, Elvis é uma experiência e tanto para sentir todas as emoções possíveis e ser impactado por cada nota musical que o longa traz com maestria. Temos aqui uma obra audiovisual que transcende musicalmente ao trazer uma manifestação tão forte da arte nas telonas. E no quesito narrativa, a vida do ator é o contraste perfeito para entregar dramaticidade e se conectar com a música e sua expressão carregada de tristeza e dor, mas também paixão pela arte. Elvis nos mostra o grande embate da vida com a arte, como o showbusiness pode ser cruel e como ao mesmo tempo que a arte se transcende, a vida mergulha em solidão absoluta e um caos psicológico que foi o grande mal de grandes artistas do século. Elvis nos traz a arte eterna, que nunca morre, mas renasce cada vez mais forte em nossos corações.
Confira abaixo o trailer oficial de Elvis (2022), que estreia nos cinemas nesta quinta, 14 de julho de 2022.
Elvis, de Baz Luhrmann | Trailer Oficial
Elvis, de Baz Luhrmann | Trailer 2 Oficial
Estou ansioso pra assistir!