Um café preto e uma sobriedade terrível. O café, seja pra curar a ressaca ou para preencher o silêncio de uma manhã. A sobriedade, para lembrar que a gente existe e que o coração ainda dói. Talvez o cigarro, para preencher um espaço no peito que parece nunca ser preenchido, criando um melodrama perfeito. Se você imaginou Amy Winehouse tocando, estou no caminho certo. Amy não fez muito parte da minha adolescência por conta do senso comum e do peso dos tabloides, que não cansavam de persegui-la. Um pouco mais tarde, entre tantas idas e vindas e tristezas da vida, consegui enxergar a potência de Amy para corações que sentem muito além do que conseguem suportar. A experiência de ouvir a voz mais marcante de uma geração é uma experiência única e que impactou e continua impactando milhões de pessoas ao redor do mundo. O legado que Amy Winehouse deixou no mundo é grandioso e arrebatador, por carregar uma personalidade única e uma história conturbada, cheia de dores, desejos, tristezas e uma intensidade e profundidade únicas desta artista icônica. “Back to Black” é o nome da cinebiografia de Amy Winehouse, título também de seu álbum homônimo de maior sucesso de sua carreira. O longa passeia pela vida e trajetória de uma voz única que se eternizou na história, carregada de timbres de dor e tristeza, além de uma melancolia feroz presente nas letras tão profundas e pessoais da cantora. Se você quer se emocionar e envolver-se com um pedaço de sua história, este filme vai tocar você. Fica aqui comigo pra gente sentir um pouquinho o que “Back to Black” trouxe para as telas do cinema.

Sinopse

Uma história contada através dos olhos de Amy Winehouse e explorando as tantas camadas de uma das maiores artistas de sua geração, além de seu relacionamento tumultuado com Blake Fielder-Civil, que a inspirou a escrever e gravar inúmeros sucessos. “Back to Black” é um filme biográfico pelas mãos da diretora Sam Taylor-Johnson (Cinquenta Tons de Cinza), que traz a trajetória da cantoria que morreu precocemente aos 27 anos de idade por intoxicação alcoólica em 2011.

Um retrato justo, sem precisar aprofundar o que é mais doloroso — e sim a doçura e essência de Amy Winehouse

Uma Amy por trás dos tabloides. Este foi o principal objetivo do longa ao retratar uma garota cheia de sonhos e esperanças de um futuro que não aconteceu. O retrato que temos em “Black to Black” confere uma sensibilidade ímpar e trás a tona toda a humanidade de Amy Winehouse, que queria ter uma vida normal como qualquer outra pessoa. O problema não eram as drogas e nem o álcool, era sua profunda tristeza e decepção por não conseguir concretizar um amor, uma vida e até mesmo uma família. Nos vícios, encontramos um lado da história que assusta por ser deturpada pelos holofotes. E com certeza não foi este o caminho de “Back to Black”, que foi lindo e inspirador ao nos presentear com uma Amy doce, frágil e amorosa. Sim, temos a Amy punk rock em alguns momentos, mas que é parte de sua personalidade forte e implacável que também amamos, mas é o que seu coração diz em cada uma de suas letras que nos arrebata.

Back to Black: Cinebiografia de Amy Winehouse | Confira a Crítica Por: Alison Roque no {Des}Construindo o Verbo
Imagem: Divulgação / Universal Pictures

Embora seja muito linda a abordagem do longa, nota-se que a diretora Sam Taylor-Johnson utiliza de caminhos muito fáceis para contar a história, sem dar voltas no roteiro e muito menos fazendo escolhas difíceis de como retratar momentos delicados. Acredito que talvez isso fique em um lugar muito cômodo e até mesmo superficial, já que não temos aprofundado alguns pontos importantes na história e até mesmo personagens relevantes na vida de Amy. Por isso, digo que esta foi uma obra honesta, mas não espetacular ao ponto de impactar o telespectador e abrir a ferida para ter conversas (ou cenas) difíceis e até mesmo pesadas. O intuito era enaltecer, honrar, humanizar e eternizar a lenda Amy Winehouse, e acredito que conseguiu cumprir seu papel, mesmo que um pouquinho.

O legado musical e a voz de Amy valorizados a cada frame   

Falando em enaltecer, aqui está um papel que o longa cumpre com maestria, trazendo os maiores sucessos da carreira de Amy para preencher a tela do cinema. Emoções fortes acompanham todos os momentos em que as canções da artista aparecem, já que o longa consegue trazer um peso para as músicas ao inseri-las em momentos pontuais, importantes e que realmente fizeram parte da trajetória de Amy em vida. Se eu me emocionei pouco? Foi muito. Amy viveu profundamente suas canções e arrebatou multidões ao colocar pra fora o que seu coração queria falar. Sua discografia é um arauto de grandes emoções e histórias, então vê-las na tela do cinema concretiza o que antes era imaginação.

Back to Black: Cinebiografia de Amy Winehouse | Confira a Crítica Por: Alison Roque no {Des}Construindo o Verbo
Imagem: Divulgação / Universal Pictures

Marisa Abela é o ponto de conexão mais forte com Amy Winehouse 

Dos trejeitos ao sotaque. Marisa Abela faz uma excelente interpretação como Amy Winehouse e, talvez, seja o que salva de fato o longa de uma grande catástrofe. A primeira impressão quando nos deparamos com o trailer foi de que a atriz estava longe de parecer ou lembrar a icônica Amy, sentimento que também compartilho. Mas ao ver a atuação de Marisa nas telonas, simplesmente fiquei encantado e maravilhado com o trabalho de interpretação que foi impecável. O timbre da voz de Amy muito evidente, os trejeitos que até podem soar caricatos, mas fazem total diferença de conexão com a artista, o jeito de falar, de agir e até mesmo de andar. Este com certeza foi o feito maior do filme, que pecou bastante no roteiro e andamento da história, mas entregou o grande talento de Abela para nós.

Performances que emocionam, impactam e carregam a melancolia cinematográfica perfeita da cantora

Se você, assim como eu, é apaixonado pelas performances de Amy Winehouse com sua voz que invade o coração e sempre emociona por ser intensa em cada nota, então este filme é para você. As performances do longa são completas, lindas, estonteantes, profundas e carregam toda a sutileza, sentimento e intensidade de Amy se apresentar. Seus olhares sejam de raiva, paixão, ciúmes, preocupação, embriaguez, tristeza, melancolia ou qualquer outro sentimento, são presentes e nítidos, nos invadindo e deixando tudo mais pessoal. Marisa Abela se não canta com seu timbre característico de Amy, consegue dublar perfeitamente até nos trejeitos e postura de Amy. O que também emociona é saber que a banda original de Amy é a banda retratada na cinebiografia, o que nos dá um quentinho no coração e deixa tudo ainda mais real.

Back to Black: Cinebiografia de Amy Winehouse | Confira a Crítica Por: Alison Roque no {Des}Construindo o Verbo
Imagem: Divulgação / Universal Pictures

Sobre o elenco de apoio, quem deixa a desejar é Blake — além de seu retrato no longa ser distante e superficial

O coração fica quentinho com a conexão retratada entre Amy e sua avó, Cynthia Winehouse, interpretada por Lesley Manville. A presença deste personagem no longa reforça muito o lado família de Amy e seu amor por sua avó, que era sua maior inspiração. Lesley mesmo com pouco tempo de tela, ofereceu momentos extremamente emocionantes e lindos, interpretando com alma e coração cada uma das cenas. Por outro lado, temos o pai de Amy, Mitch Winehouse, interpretado por Eddie Marsan, que não gera tanta empatia com o público mesmo sendo uma figura de suporte e apoio importantes para sua filha. Acredito que o papel de Mitch no longa assemelhasse muito ao de um guarda-costas, diferente do carinho e ternura que preenchiam as cenas entre Amy e sua avó, Cynthia.

Back to Black: Cinebiografia de Amy Winehouse | Confira a Crítica Por: Alison Roque no {Des}Construindo o Verbo
Imagem: Divulgação / Universal Pictures

Mas o que pode incomodar um pouco, é a presença estranha e distante de Blake Fielder-Civil, ex-marido de Amy Winehouse e sua maior paixão em vida. A interpretação de Jack O’Connell tornou o personagem algo difuso, longe da história e de difícil compreensão sobre seu jeito, caráter e como ele foi realmente ao lado de Amy.

Back to Black: Cinebiografia de Amy Winehouse | Confira a Crítica Por: Alison Roque no {Des}Construindo o Verbo
Imagem: Divulgação / Universal Pictures

“Back to Black” poderia ser mais profundo e não chega aos pés da grandiosidade de Amy Winehouse

Back to Black: Cinebiografia de Amy Winehouse | Confira a Crítica Por: Alison Roque no {Des}Construindo o Verbo
Imagem: Divulgação / Universal Pictures

Mas dá para o gasto. Embora com tantos problemas de narrativa, uma escolha ou outra de elenco e de quais personalidades incluir na história, “Back to Black” teve propositalmente a escolha de não contar a história nos mínimos detalhes, sendo emocionante na construção e abordagem musical, mas pecando no que a artista mais tem para oferecer — uma intensidade sem igual para sentir, absorver e arrebatar através da música. A verdade é que Amy Winehouse é grandiosa demais para uma cinebiografia como esta. Sua energia, presença, carisma, personalidade e coração são únicos. O que este longa fez, foi oferecer compaixão para quem foi Amy em vida, alguém que amava demais e só queria ser amada. Mas acredito que o desejo maior de Amy foi concedido — ser lembrada como uma cantora e por sua voz. O importante é eternizarmos por mais tantas gerações uma voz que nunca vai sumir, sempre vai viver em muitos corações.

Escrito por

Alison Henrique

Publicitário, Empresário, Dançarino, Cantor, Estudante de Filosofia e, claro, APAIXONADO por Cinema, Arte, Música e Livros. Crítico de Cinema aqui no {Des}Construindo o Verbo com muito sentimento, emoção e boas reflexões pra gente mergulhar nas obras do cinema contemporâneo. Seja Ficção, Drama, Romance, DC, Marvel, Ficção Científica, Bom, Ruim, Médio ou Péssimo. A gente sempre vai se encontrar por aqui pra discutir um pouco sobre tudo. Instagram: @alisonxhenrique.