Meu eu adolescente de 15 anos – meio culto, nerd e aventureiro, que cantava Legião Urbana sob voz e violão no Colégio público de uma comunidade da Cidade Industrial de Curitiba – entrou em êxtase e me fez reviver as emoções de uma obra que ainda é parte de mim. Mesmo que um pouco saturada por conta de karaokê com hétero bêbado que canta mal, as lembranças boas de um “hino” tão grandioso como esse nunca saem da nossa vida. E quando o “hino” vira uma comédia romântica nacional impecável, a gente comemora o nascimento de um novo legado – uma nova obra, em um novo momento.
O longa “Eduardo e Mônica” é uma adaptação da canção homônima da banda Legião Urbana, que traz uma história de amor vivida em Brasília, na década de 1980. Após uma série de coincidências levarem Eduardo e Mônica se conhecerem em uma festa, suas muitas diferenças não os impedem de se apaixonarem perdidamente e viverem uma intensa história de amor.
É tudo sensível, intenso e verdadeiro
Tudo acontece de maneira natural, fluida e agradável. Sabe aquele desconforto de assistir algo superficial, que não representa a vida como ela é? Não existe aqui. Talvez um dos motivos principais seja de se tratar da história do casal mais famoso e querido do Brasil, mas aqui temos grandes destaques para a narrativa muito bem construída, o casamento perfeito dos protagonistas com os personagens e a forte conexão que o conjunto da obra trouxe para com o espectador.
Esta é uma história de amor muito bem contada. Fugindo totalmente de um romance estilo “malhação”, a direção de René Sampaio (Faroeste Caboclo – 2013) preserva fielmente os versos da música, claro que com mudanças sutis e elementos que agregam à narrativa, mas tudo acontece de maneira leve e mostra um longa muito cuidadoso.
As peculiaridades da vida de Eduardo (Gabriel Leone) e também da vida de Mônica (Alice Braga) são muito bem exploradas no filme, além da atuação impecável dos atores que transparece de forma apaixonante nos personagens. Enquanto vemos uma Mônica destemida, empoderada, resiliente e que sabe muito bem o que quer; temos Eduardo, um jovem carismático, intenso e de atitude. Nessas diferenças, vemos nascer uma história de amor complexa, criando um longa que é um romance, comédia e drama.
Mutantes, Bauhaus, Titãs e Bonnie Tyler
Da música viemos, e para a música voltaremos. É aqui que nos encontramos com trilha sonora que traz o rock brasileiro em seu auge, além do rock britânico e os hits dos anos 1980 que são sucessos até hoje. E seria impossível não termos ao menos um rock memorável do Legião Urbana, claro. Afinal, foi o Legião um dos precursores de um novo estilo do rock – entrando na cena como a eterna Aborto Elétrico, e se encontrando mais tarde com a identidade de trovador solitário de Renato Russo – era que nos presenteou com Faroeste Caboclo e Eduardo e Mônica, por exemplo.
Anos 1980 x 2022: dá pra se identificar com esse amor?
Como uma pessoa analítica que sou, não perdi a oportunidade de fazer esse comparativo. E diria que sim, é uma história que poderia facilmente ser um romance complexo e cheio de diferenças em 2022. A luta pelos direitos sociais, a luta pelo fim do saudosismo à ditadura, as relações familiares complexas, as performances artísticas, o encontro das diferentes tribos – os jovens místicos, politizados e cultos, jovens que vão pra cachoeira, jovens que ficam em casa jogando video game (ou futebol de botão, por exemplo) etc.
Num museu de grandes novidades que são o passar dos anos na sociedade, temos uma história agora eternizada em um longa, que nos lembra de amar mesmo nas diferenças, respeitando as peculiaridades de cada um. Eduardo e Mônica não é só para românticos incuráveis, mas pra quem quer encontrar amor onde parece impossível – e até pra quem não quer, mas encontra sem querer. A identificação não é só com o amor, mas com todos os problemas da vida adulta que o circundam – e isso que traz o longa para a nossa realidade.
Quem um dia irá dizer que existe razão nas coisas feitas pelo coração?
“E quem irá dizer que não existe razão?”. O verso com referência ao filósofo Blaise Pascal é quase um patrimônio nacional, que não apenas dita o tom da canção como determina todo o desenrolar da narrativa, levando os acontecimentos mesmo que para rumos diferentes em algum momento, mas todos destinados a uma grande paixão. Aqui, o amor transformou-se em arte. É como os versos simples da música e de fácil conexão e compreensão, mas que no fim, se juntam para virar uma obra grandiosa.
O Brasil está cheio de amor pra dar – na vida e no cinema nacional
É, Brasil. Entre amores complicados e romances enrolados, a gente tem poucos romances nacionais para carregar no peito. Mas saí do cinema decidido: Eduardo e Mônica é, para mim, o melhor romance nacional. É tocante, envolvente, engraçado e nada cansativo, chato, superficial ou massante. Foram 2h de filme extremamente prazerosas. Sinceramente, não esperava muito, e foi uma baita surpresa sentir o quanto o longa que mexeu comigo. Merece toda a aclamação possível, principalmente pelo fato de ter ganho prêmio de melhor filme internacional no Festival Internacional de Cinema de Edmonton, do Canadá.
Eu acredito veementemente que Eduardo e Mônica vai além de emocionar os fãs de Legião Urbana, e ser um longa feito total e exclusivamente para este público. Revivi muitos sentimentos e me emocionei com isso, claro. Mas é sempre tempo de viver o novo tempo de uma obra inserida em um novo contexto, por isso, acredito que esta é uma grande aposta para agradar todos os públicos que gostam de um romance de qualidade, sejam eles de quaisquer idades. O amor nunca sai de moda, né? E vivê-lo no cinema é algo sempre mágico e sempre marcante.
Confira abaixo o trailer oficial de Eduardo e Mônica (2022), que estréia nos cinemas nessa quinta-feira, 20 de janeiro de 2022.