Retratar uma guerra é um meio de se fazer lembrar tudo o que aconteceu para chegarmos até aqui. Retratar a violência é um meio de mostrar as barbáries que o homem é capaz para justificar seus ideais, fazer perseverar suas ideologias, crenças e a ideia de mundo que existe em sua mente condicionada, limitada, militarizada e manipulada. O retrato em específico da violência, serve para fomentar, alertar, informar, conscientizar e documentar a realidade de uma sociedade severamente perdida, polarizada e afundada nos horrores da história. É por isso que a gente se lembra e precisa cada vez mais nos lembrar — para construir um futuro que não seja mais preso ao passado, que transforme-se em memória para os dias que virão (se é que eles virão). Talvez seja este o propósito de “Guerra Civil”, um longa instigante e impactante que aborda o jogo de narrativas — até as mais deturpadas e abomináveis possíveis — no meio de uma guerra e um olhar realista, duro e vívido sobre uma violência terrível que assola um país inflamado em confrontos, e como esta violência deixa marcas em nossa mente para nunca mais serem esquecidas.  

Sinopse

Guerra Civil é do mesmo roteirista de Extermínio (2002) e Ex Machina – Instinto Artificial, Oscar 2016 de Melhor Efeitos Especiais, e indicado ao Oscar de Melhor Roteiro Original. Nos Estados Unidos, em um futuro próximo, diversos estados se rebelam contra o governo americano. Com a guerra interna declarada por esses exércitos, denominados Forças Ocidentais e Aliança da Flórida, alguns jornalistas (Kirsten Dunst e Wagner Moura) se esforçam para cobrir o evento e contar a história. O problema é que o caos se espalha com intensidade e a ideia de rumar para a capital americana expõe o potencial de perigo do conflito para os cidadãos. 

Tensão e dramaticidade impecáveis do início ao fim 

É uma narrativa que prende você em uma jornada de tensão como se estivéssemos no meio de um tiroteio e atentos para ambos os lados de um confronto, as mortes espalhadas pelo caminho e o sangue pintando as ruas de uma civilização devastada. O grande responsável por nos deixar com o coração na mão, é o diretor Alex Garland, gênio por trás de Ex_Machina: Instinto Artificial (2014) e Aniquilação (2018), e que nos deixa vidrados, desesperados e tensionados pelo desenrolar de acontecimentos tão duros e fortes registrados por lentes agitadas e com realismo nítido. Mas o que mais nos invade é, sem dúvidas, o peso dramático conferido aos personagens e seus sentimentos que transpassam a tela do cinema e criam uma empatia sem igual através de suas dores, melancolias, aflições, medos e até mesmo a força e coragem para enfrentar uma guerra sem pestanejar. 

A política não tão aprofundada é proposital? Qual é seu papel?

Afinal, qual mensagem a abordagem política quer passar? O contexto é claro: um país (EUA) dividido, marcando o confronto inflamado entre Texas e Califórnia, que espalha medo, violência e morte pelas ruas. Mas muito além disso, não é preciso justificar a guerra e apresentá-la ao espectador. Uma granada explodindo, uma metralhadora atirando e todos os interesses políticos por trás dessas ações nós já sabemos de cor. O que “Guerra Civil” nos trás, é o retrato da violência que nos paralisa, nos deixa no fogo cruzado para entender a dor, assistir a morte se aproximando de nós e não temê-la, mas enfrentá-la para buscar a verdade que passa despercebida ali, no meio da batalha, e quase ninguém consegue ver. 

Guerra Civil: Um retrato fiel e profundo sobre a violência, a polarização e a barbárie {Crítica}
Foto: Divulgação / Diamond Filmes

No meio desta guerra, Lee, Joel e Sammy representam fielmente o registro da história que nos mantém vivos, lúcidos e sem esquecer das tragédias do passado e das lutas que não são do nosso interesse, mas que nós, como sociedade, pagamos com a vida. Além disso, trazem muitas questões sobre todos os lados da guerra, da política e de uma sociedade polarizada. Afinal, de que lado você está? Você irá se isentar? Você viverá longe do fogo cruzado sem querer se envolver? Até onde vai a luta pela paz e quais os limites existentes entre não querer mais guerras e se isentar totalmente do conflito? Esses são debates importantíssimos levantados pelo longa.

A fotografia e o fotojornalismo mostrando seu poder nos cinemas (e no mundo)

A única arma é uma câmera fotográfica. Este é um dos pontos cruciais e de maior peso deste filme tão simbólico e impactante. “Guerra Civil” consegue nos prender do início ao fim em uma fotografia que retrata a violência física do humano em meio a guerra, e a violência psicológica que nosso próprio olhar para a guerra traz para nossas mentes. Olhar o mundo é duro demais. Assistir à mortes e manter-se firmes para enfrentá-las duramente é importante para definir nosso papel no meio desta tragédia, e o que nosso olhar pode falar para tantos outros que não estão ali presenciando confrontos brutais e desumanos. A fotografia fala por si. O fotojornalismo eterniza a história. A memória se faz eterna.

Guerra Civil: Um retrato fiel e profundo sobre a violência, a polarização e a barbárie {Crítica}
Foto: Divulgação / Diamond Filmes

Um elenco grandioso que vai além de Kirsten Dunst e Wagner Moura

É claro que Kirsten consegue facilmente atingir uma dramaticidade ímpar na sua interpretação, brilhando em qualquer papel que se propõe. No longa, Kirsten interpreta a fotojornalista Lee Smith, consagrada por seus registros históricos dos horrores da guerra e violência pelo mundo, forte o suficiente para enfrentar confrontos sanguinários mas ainda assombrada por traumas registrados em suas lentes. Kirsten tem uma atuação de impacto, deixando sua marca no longa e, principalmente, em nossa mente e coração. 

Guerra Civil: Um retrato fiel e profundo sobre a violência, a polarização e a barbárie {Crítica}
Foto: Divulgação / Diamond Filmes

Já Wagner Moura, que interpreta Joel, repórter de uma agência de notícias, brilha em um protagonismo vertical com muita força e vigor para proteger, mediar e também oferecer momentos mais descontraídos. Mas Joel também confere momentos que vão desde sua coragem para enfrentar os confrontos até uma tensão e que chega a arrepiar. Wagner é nosso orgulho brasileiro que brilha em uma estréia mundial que, sem dúvidas, renderá um prestígio e muitos papéis grandiosos para sua carreira. 

Guerra Civil: Um retrato fiel e profundo sobre a violência, a polarização e a barbárie {Crítica}
Foto: Divulgação / Diamond Filmes

Quem serve uma atuação dramática, digna e muito sensível é Cailee Spaeny, que interpreta a aprendiz a fotojornalista Sammy. Uma personagem que deveras, no primeiro momento, parece distante da história, mas vai ocupando cada vez mais tempo de tela e nos deixa encantados por sua força, coragem e olhar ainda despreparado para tanta barbárie. Sammy é, de fato, minha personagem favorita do filme, principalmente por sua jornada identificável e que nos deixa uma boa mensagem sobre coragem e superação diante dos momentos mais críticos em uma guerra.

Guerra Civil: Um retrato fiel e profundo sobre a violência, a polarização e a barbárie {Crítica}
Foto: Divulgação / Diamond Filmes

“Guerra Civil” traz o retrato e o olhar profundo sobre as barbáries da guerra, política e da violência 

Guerra Civil: Um retrato fiel e profundo sobre a violência, a polarização e a barbárie {Crítica}
Foto: Divulgação / Diamond Filmes

É no âmago de “Guerra Civil”, que encontramos a violência mais profunda causada pela polarização. É o retrato fiel do que vivemos no Brasil e no mundo. Uma luta dividida, militarizada, politizada e inflamada por ideais opostos, desiguais e perdidos no passado, sem entender o presente e ansiando por um futuro que não existe. Tudo isso é fato histórico. É o registro de tudo isso, é o que passa na TV e principalmente em nosso feed, que nos faz temer confrontos que beiram à barbárie. Que nos fazem questionar a fé na humanidade, mas também as razões para tantos confrontos — se não a luta por interesses pessoais e políticos e uma ideia de mundo que não existe. O retrato fiel de uma humanidade em guerra, sejam elas ideológicas ou armadas, fazem-nos traçar novos caminhos em busca de um futuro mais justo em que o homem não destile mais a violência sobre a humanidade. 

Confira abaixo o trailer oficial de Guerra Civil (2024), que estreia nos cinemas nesta quinta-feira (18).

Escrito por

Alison Henrique

Publicitário, Empresário, Dançarino, Cantor, Estudante de Filosofia e, claro, APAIXONADO por Cinema, Arte, Música e Livros. Crítico de Cinema aqui no {Des}Construindo o Verbo com muito sentimento, emoção e boas reflexões pra gente mergulhar nas obras do cinema contemporâneo. Seja Ficção, Drama, Romance, DC, Marvel, Ficção Científica, Bom, Ruim, Médio ou Péssimo. A gente sempre vai se encontrar por aqui pra discutir um pouco sobre tudo. Instagram: @alisonxhenrique.